As últimas notícias e polêmicas de muitos na internet sobre a sexualidade colocada nos animes e mangás shounens me chamou a atenção para uma coisa: Shounen ainda é para os shounens?
Para começar nossa conversa, para aqueles perdidos que acabaram de entrar no mundo dos mangás e animes e ainda não compreendem bem: Shounen não é uma categoria e sim uma demografia!
Sim! Apesar de muitos categorizarem animes como One Piece, Naruto, Dragon Ball, Boku no Hero, entre muitos outros como shounen, essa “categoria” surgiu com o tempo e o costume de muitos associarem o termo com a tradicional história do jovem herói em uma longa jornada de desenvolvimento próprio para conquistar algo desejado, usado na maioria dessas obras. Mas na realidade, a princípio, esses mangás/animes só foram considerados shounen porque foram feitos para uma faixa etária de garotos entre 12 e 18 anos e lançados em revistas próprias para eles.
A palavra japonesa é escrita com o kanji 少年, que literalmente significa “vida pequena”, mais precisamente, o termo se traduz como “menino”.
Hoje em dia as duas maiores revistas de mangás desse tipo no Japão, e que dão origem aos mais famosos animes, são a Weekly Shounen Jump (Naruto, Dragon Ball) e a Weekly Shounen Magazine (Fairy Tail, Nanatsu no Taizai). Só que vamos combinar? Já a alguns anos as duas revistas e outras mais tem cada vez mais se afastado de um conteúdo que a maioria considera próprio para shounens.
A Weekly Shounen Magazine é o maior exemplo disso, com o maior número de obras com ecchis mais, digamos, “pesados”. Por exemplo, todo fã de Nanatsu conhece o fetiche de Meliodas de olhar em baixo da saia da Elizabeth a todo momento e apertar seus seios, e tem também o ecchi (segundo alguns desnecessário) de Fire Force, e em Fairy Tail as garotas são por muitas vezes sexys. Mas o motivo dessas mudanças de conteúdo, na minha opinião, é, na realidade, simples, e ela tem acontecido há muitos anos, bem antes dos atuais shounens terem sequer nascido.
As revistas que deram origem a essas séries começaram suas publicações lá nos anos 60 e 70 com séries que realmente eram voltadas para este tipo de público, e algumas conhecidas até nos dia de hoje como Ashita no Joe, Dr. Slump e Gegege no Kitarou. Nesta época as histórias eram mais inocentes, e sim, algumas mostravam calcinhas e peitos mas não era como nos dias atuais. A mudança, eu acho, começou no final dos anos 80, na mesma época de Dragon Ball. Quem não se lembra das censuras feitas no anime quando ele veio para o ocidente, onde cortaram cenas como o tapinha de Goku nas partes intimas de Bulma, ou dela levantando a roupa para mostrar suas partes baixas para o mestre Kame?
O que acontece é que já nesta época os primeiros leitores das revistas estavam crescendo e passando da idade a que elas são direcionadas, porém muitos continuaram consumindo as publicações. Além disso no começo dos anos 90, temos o desenvolvimento de novas tecnologias, os jogos eletrônicos se tornavam mais e mais populares, as pessoas passavam cada vez mais tempo em frente às televisões e mais pra frente temos o surgimento da internet. Com tudo isso, mesmo num país em que a leitura é bem incentivada como o Japão, os mais jovens perderam cada vez mais o interesse nos livros e mangás. Em resumo, o que aconteceu foi que os mais fieis leitores dos mangás shounen ficaram velhos e por tanto legalmente capazes de consumir o conteúdo atual.
Um recente relatório demográfico da revista Weekly Shonen Jump para 2019, mostrou que 46,8% de seus leitores têm 18 anos ou um pouco menos (idade que a sexualidade já é natural), enquanto 53,2% de seus leitores têm 19 anos ou mais. Além disso o publico feminino tem aumentado cada vez mais.
Eu vi numa reportagem sobre um usuário japonês do Twitter que conversou com sua filha de 12 anos sobre a Shounen Jump e sua influencia nas crianças, e ela intrigada perguntou se a revista não era uma revista de adultos porque nenhum de seus colegas de escola comprava, e o que ela tinha lido da revista foi do exemplar que o próprio pai havia comprado. Muitos se identificaram com o twit e disseram que só começaram a ler a revista por volta dos 14, 15 anos de idade.
Aliás, você sabe como são decididas as séries que serão publicadas nas revistas?? Opinião do leitor!! É verdade que os editores fazem a primeira triagem das histórias, mas é mais para que não sejam publicadas histórias muito ruins e irrite os leitores. Depois dessa triagem, a maioria são publicadas em One Shots e os leitores dão seus votos nos questionários em que eles gostaram mais, e as primeiras colocadas são serializadas (algumas poucas histórias vão direto para a serialização, mas só se forem muito boas mesmo). Além disso, para se manterem serializados, os leitores têm que gostar delas. Toda semana são pedidas as opiniões do público de quais se sobressaíram mais, se o mangá ficar em uma posição muito baixa por muito tempo ele é cancelado (A venda de volumes compilados também influencia, como foi o caso de Bleach que não era muito popular na revista mas vendia muito complicado).
Ou seja, se a opinião do público é levada em conta e o público já não é mais jovem, mas sim quase adulto, e é meio obvio que os conteúdos dos mangás vão mudar para agradar esses leitores, e meio óbvio que leitores jovens adultos vão valorizar um ecchizinho.
Falando dos animes, muitos deles são exibidos no Japão em momentos em que os meninos provavelmente não são capazes de assistir. O Dr. Stone, por exemplo, aparece às 22h e Kimetsu no Yaiba às 23h30, bem além da hora de dormir da maioria das crianças. Os que são exibidos mais cedo são os que tem conteúdo menos erotizado, com menos ou nada de cena imprópria.
Resumindo, todos, até mesmo os próprios autores e produtores já perceberam que essa história de shounen voltado para publico shounen já não existe mais. Mas porque manter o nome “shounen” nas revistas então? A resposta é dinheiro. Os nomes das revistas viraram meio que o nome de suas marcas, agora imagina se uma marca famosa muda seu nome de repente. Ela poderia perder a maior parte de seu público que não ia entender nada ou não iria gostar e até inconscientemente gerar dúvidas em seu público. E no caso das revistas, perder mais de 40% dos leitores que ainda são menores de 18.
Então a próxima vez que você ver uma polêmica envolvendo cenas inadequadas nos animes e mangás, já pode dizer que 1º eles já não são feitos mais só para crianças, e 2º o próprio público é quem está escolhendo ter esse tipo de conteúdo.
Parabéns pela postagem e sim concordo que o conteúdo das revistas é para um público +16 anos que gosta de apreciar as calcinhas das meninas, peitos e bundas e exigem esse conteúdo nas publicações e animações. Para mim os animes permitem duas situações que filmes e séries com atores reais não permitem. 1 situação: Todas as meninas da série e a heroína principal pelo simples fato de ser desenhado a mão em plataforma digital permite que os desenhistas tenham a liberdade de desenha-las nuas e em trajes muito sexy como calcinha e sutiã e biquínis para agradar o público como eu que adora esse conteúdo. 2 situação: Geralmente durante a exibição do anime na Tv os desenhistas de doujin desenham e criam historias utilizando as personagens femininas do anime praticando sexo livremente, sinto que há um consenso na indústria de que os famosos mangás pornográficos denominados doujin, necessariamente não precisam de licença dos autores para desenharem suas personagens fazendo sexo e venderem essas revistas em lugares do Japão não, porque é tipo como uma propaganda a mais para série original. E então é por isso que adoro ler mangás e assistir animes. Quando assisti SAO pela primeira vez, fiquei louco para ver a Asuna pelada e fui procurar no glogle e achei belas imagens e satisfiz meu desejo. Depois passei a querer ver a Asuna fazendo sexo com o protagonista no modo vanilla, então descobri os doujin e desde então nunca mais parei de ler doujin. E sempre você pode se aventurar a desenhar você mesmo sua personagem favorita nua ou fazendo sexo com você, é o que nós otakus hétero chamamos de justiça com as próprias mãos.
Kkkkk boa idealização de otaku, acho que tem aquele dilema né ? Se não quer, não assiste
Muito bom muito bom, curti pacas
excelente matéria, mais uma vez gostaria que colocassem a opção de comentar pelo disqus
Excelente matéria mestre!!
Ótima matéria. Só que você se esqueceu mencionar um detalhe importante: o fator demográfico.
No Japão, a taxa de natalidade têm decrescido desde os anos 1980 para cá, ou seja, há menos leitores infanto-juvenis nascendo lá e é por isso que as revistas como a Shounen Jump são agora lidas por leitores adolescentes e até mesmo por jovens adultos, além de terem atraído o interesse de leitoras do sexo feminino. O resultado disso é o que se vê agora nos shounen mangás: garotas com um visual sexy (para deleite dos leitores que já não são mais “shounen”) e rapazes atraentes (para deleite das leitoras que em outros tempos estariam lendo shoujo ou jousei mangás). Quem já leu o mangá Bakuman (da JBC) têm uma idéia de como é o cenário atual dos shounen mangás atuais.
Finalizando, gostaria de sugerir a seguinte matéria para o próximo post: o fenômeno “crossover”. Não, não é sobre aquele “crossover” de personagens de mangás e animes que todos já ouviram falar, mas sim sobre outro tipo de “crossover”. No caso em questão, o crossover de leitores de faixas etárias e gêneros diferentes. Um exemplo: leitores adultos que lêem shoujo mangás e leitoras adolescentes que lêem shounen mangás. O que leva leitores(as) de faixas etárias e de gênero diferentes a consumirem mangás que não são destinados originalmente a eles(as)? O que esse tipo de público procura nos mangás? E qual o impacto disso no mercado editorial japonês e na definição do que é shounen, shoujo, seinen e jousei mangá?
Devo avisar que procurei saber mais sobre esse tipo de “crossover” na internet brasileira, mas não encontrei nada. No entanto, o termo aparece no livro “Manga! Manga!: The World of Japanese Comics” . Talvez alguém que conheça mais sobre o público japonês que lê mangás possa dar mais informações a respeito. Seria uma interessante sugestão para o próximo artigo.